sábado, 12 de julho de 2014

TERRA SEM LEI - Capítulo 2





No segundo capítulo eu apresento ao leitor a alegre família Silva, formada pelo pelo patriarca João Silva, sua esposa Teresa, os filhos José, Paulo, Marina, Judite e o menino Joãozinho, além de Bernadete, irmã de Teresa, e Felícia, uma espécie de serviçal da família. Eles moram numa pequena fazenda da qual tiram o alimento para sobreviverem. O grande problema é que a propriedade fica exatamente nas terras em que Carlos Lucena tem grande interesse, mas que o João Silva não as vende por dinheiro nenhum.

Confiram a íntegra do capítulo. Espero que gostem.



2

SILVA


A manhã estava muito bonita naquele dia, o vento forte fazia a terra seca desprender-se da superfície e banhar de areia aquela casa simples, de pequenos currais com porcos, um extenso galinheiro e alguns gados esguios que comem um resto de pasto seco que ainda existe por ali.

Dentro do pequeno curral, um homem de aparência já bem desgastada, barbado e com trajes rudes típicos da região, peleja sofrivelmente para tirar algum leite de uma vaca magricela. Por trás desse homem chega um garoto de mais ou menos dez anos, cabelos loiros e olhos azuis, com vestimentas rudes iguais ao do homem. O garoto o chama:

− Pai!

O homem se volta para o garoto ligeiramente, e soltando um discreto sorriso responde:

− Oi Joãozinho, o que quer?
− A mamãe está chamando pra se despedir da tia Bernadete, ela já vai voltar pra casa dela – responde o garoto Joãozinho de imediato.
− Está bem, meu filho. Avise que já vou.

E o garoto volta correndo, ele atravessa todo o terreiro da casa, passando pela cacimba e o galinheiro e se dirigindo pra dentro de casa. O homem acompanha o garoto mais de longe, daí ele chega à porta, ao olhar para dentro de casa ele avista a mesa da cozinha rodeada por sete pessoas, sendo um deles Joãozinho, que está ao lado de sua mãe, além de dois rapazotes, uma mocinha e outra menininha, que parece ser um pouco mais velha que Joãozinho. Outra mulher, a mais bem vestida, se dirige para o homem dizendo:

− João, meu velho cunhado, agradeço demais a sua hospitalidade, mas, agora tenho que ir.
− Você sabe que é sempre bem-vinda em nossa casa, Bernadete – responde João apertando delicadamente a mão da mulher.
– Venha sempre nos visitar minha irmã – é o pedido da mãe dos meninos.

Bernadete se volta para a outra lhe dando um forte abraço, em seguida reclama:

– Você é que deveria visitar minha casa, Teresa. Seria ótimo passarmos o dia juntas passeando por toda a cidade.
– Pode apostar que vou – responde Teresa soltando um largo sorriso.
– E nós vamos com você, não é mamãe? – indaga uma das meninas.
– Claro, Marina. Você e Judite irão comigo quando eu for visitar a tia Bernadete.
– Hei! E nós? – reclama o primogênito da família.
– Vocês homens ficarão comigo aqui na lida, e só irão à cidade quando eu for – intervém João na conversa.
– Ah papai! – a reclamação dos meninos é geral.

Bernadete ri ao ver a situação dos garotos, daí ela se lembra:

– E Felícia, onde está ela?

De súbito surge uma mulher negra e já idosa, com uma bacia na mão e roupas sujas em seus braços:

– Estou aqui, Dona Bernadete.
– Ah Felícia! Já estou indo e vou sentir saudades de você – afirma Bernadete dando um forte abraço na negra.

Todos vão para fora da casa e se dirigem para o oitão, onde está o coche de Bernadete. João previne:

– Tome cuidado, cunhada. Esses caminhos do sertão estão a cada dia mais perigosos.
– Não se preocupe João, estou acostumada a andar por essas estradas desertas, e nunca vi nada de anormal – abranda a elegante mulher.
– Não se esqueça de encomendar o meu vestido, ouviu titia? – avisa a menina Marina.
– Pode deixar querida, não vou me esquecer.
Um dos meninos, enciumado com a irmã, atiça:
– Nenhum vestido vai te deixar mais bonita.
– Nem mais feia! – completa Joãozinho.

Risos dos garotos.

– Vocês são insuportáveis! – reclama a mocinha com muita raiva.

Mais uma vez João intervém:

– Não quero briga, meninos. Calados e respeitem a sua irmã.

Ainda rindo com aquela situação, Bernadete sobe e entra no coche que ela mesma vai guiar, onde ela invoca o cavalo e avança, se despedindo:

– Até logo minha irmã! Tchau João! Tchau crianças! Até mais ver Felícia!

E todos respondem positivamente para a dama que se distancia e segue sertão adentro.

Os garotos logo se espalham: José e Paulo, os mais velhos, partem para um depósito de ferramentas, pegam cada qual uma enxada e vão para o roçado; Marina e Judite vão tirar água da cacimba; já Joãozinho, vai para o curral, onde tenta continuar o que seu pai estava fazendo: tirar leite da vaca magricela.

Ao lado de Teresa, João observa a movimentação harmoniosa em sua casa e exalta:

– Eita garotada esperta!
– É verdade, João – concorda a mulher soltando um largo sorriso.

Os dois caminham em direção a casa e Teresa, de súbito, se lembra:

– João, e o Sr. Carlos Lucena, será que ainda vai aperrear a gente pra comprar essas terras?
– Acredito que não. Depois do que eu disse àquele velho Corrêa sobre a sua proposta, acho que o Sr. Carlos deve ter se convencido de que nunca venderei as terras que pertenceram aos meus pais e avós – responde João bastante convicto.
– Eu só queria saber qual o interesse tão grande dele por essas terras secas e desertas – retruca Teresa, intrigada.
– Eu também. Deve haver um motivo muito forte pra ele querer dar tanto dinheiro justamente por nossas terras, um motivo que só ele sabe.

De repente, Teresa faz com que eles interrompam a caminhada e pergunta:

– João, você não acha que depois de tanta insistência, não está na hora de você conversar com Carlos Lucena ao menos pra saber a razão dessa questão toda?

João frisa bem o seu olhar no de Teresa, pensa um pouco e em seguida responde:

– É Teresa, talvez sim! Mas preciso pensar muito antes de decidir falar com aquele lá.
– Você é quem sabe! – completa a mulher dando um ponto final à conversa.

Os dois continuam a caminhar juntos até a entrada da casa, quando Teresa entra e João se dirige para o velho depósito de ferramentas e com uma enxada segue para o roçado ajudar José e Paulo na lida.


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Luis Boto


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